16 de agosto de 2013

Guarda-chuvas

Águeda- Portugal.   Imagem Yahoo notícias.



Guarda-chuvas ambulantes
De todos os lados
Nas ruas, afoites
Guardando as lágrimas do céu

Cada gota, cada poça
Cada pé, cada passo
Cada cabeça, cada mundo

Guarda-chuvas corriqueiros
Movem-se depressa
Pés ligeiros
Correndo no sentido do córrego
Que deságua no mar da aflição

Dia que mais parece noite
Sol que não se vê
Vidas passageiras nas calçadas
Passageiros vivendo nos automóveis

Guarda-chuvas coloridos
Formas iguais
Funções semelhantes
E mesmos objetivos

Não se vê cara
Só se vê o mais caro
Coração nem se fala
O que vale é o ganha pão

Guarda-chuvas superficiais
Horas correm, tempo passa
Guarda-chuvas nunca param
E a água nunca cessa

Um dia um vento forte
Levou as hastes
Do guarda-chuva granfino
Do guarda-chuva branco
Do guarda-chuva preto
Do guarda-chuva rosa
Do guarda-chuva multicor
Só o que ficou foi o rastro de lama
Por onde o guarda-chuva  passou
De repente, então
A chuva parou.

Júlia Helena

Novidades

Infelizmente não tenho feito muitas postagens aqui, devido as mudanças (ótimas e breves) pelas quais o blog está passando. Hoje venho mostrar uma das diversas novidades que teremos daqui a pouco tempo.
A nova coluna de Artes Plásticas aqui no Cativando-se terá dois ilustres artistas: Fillipe Azevedo e Yan Aleksander. O trabalho deles é simplesmente incrível, embora sejam estilos totalmente diferenciados. Na verdade, essa é a grande qualidade de ter os dois numa mesma coluna- passar do clássico para o contemporâneo numa sutileza adorável.
Recentemente fui surpreendida com dois desenhos que amei, não só pelo fato de serem um presente, mas por fazer parte de uma releitura do meu último poema postado ("À flor da pele").
É bem interessante observar a visão de cada artista sobre uma mesma obra e como eles utilizam seus estilos para descrever nos traços a visão do que não se pode dizer.
Espero que gostem, assim como eu adorei!

Desenho do Fillipe Azevedo:


Peço perdão pela luz da imagem. Além de que, o desenho estava semi-pronto (a minha ansiedade de mostrar pra vocês não esperou).

Desenho do Yan Aleksander:


10 de agosto de 2013

À flor da pele

Fotografia por Arthur Castro.  FocosPro

Acabo por findar meu dia
Com o sentimento de chão não ter
Tempo bom era na calada da noite
Em que tempo não parecia haver
Para ser turista de minha fantasia

O dever nem sempre equivale a minha obrigação
Às vezes, penso que devo
Outros momentos finjo que não

Sou obrigada a ser quem sou
Mesmo que o meu eu
Transborde de mim

O tempo me diz
Que os ponteiros ainda demoram a se encontrar
A hora da partida
Sempre requer a passagem por um piscar
A chegada sempre ecoa como o canto dos deuses

Mas quem dirá o que é o tempo?
Essa estranha forma de medir o rumo e o tamanho das sensações
Esse retrato em preto e branco das recordações
Esse destino que se afasta do princípio
E que mata cada minuto, lentamente

Penso nas palavras mal-ditas
Nos beijos não-roubados
Nos abraços repugnados
Nas lembranças esquecidas
Na matéria da vida
Que vida não há de ser

Sinto que sou única e imperfeita
Escultura sem acabamento
Mão de obra cara
E trabalho mal feito

O que restou de mim foi esta pobre alma
Que o tempo não conseguiu apagar
E que clama incessante
Por ter momentos mais sutis
Das alegrias mais diversas

Simplicidade é amar
Mesmo antes de descobrir toda a verdade
Do karma que te traz aqui:
E que forma de amor é essa
Em que se oferece o que não se recebe
E se recebe o que não se quer ter?

Antes mal-amado do que amando mal
É triste não ter abrigo para meus olhos
É estranho ser um objeto banal
Dos olhos que não estão em mim

Jamais “discutirei Caetano”
Ou pularei da janela do “Oitavo andar”

Viverei na paz de mim
Morrerei no percurso de cada dia
Serei fiel as minhas últimas regalias
De pronunciar o que quiser
Escrevo porque falar já não sei mais
Uma parte de mim se trancou no escuro
O outro lado ainda procura a luz

Que a humanidade me perdoe
Mas ninguém sabe desse trauma
de viver com a pele
tão a flor assim.

Júlia Helena